Pe. Liginaldo Miguel
A solenidade do Santíssimo Sacramento do Corpo e do Sangue de Cristo nasce no século XIII, em contexto medieval, como fruto da devoção à Eucaristia enfatizada nesta época. Esta festa tinha como objetivo reafirmar e defender a fé na presença real de Jesus na Eucaristia, que vinha sendo fortemente questionada por movimentos contrários. É possível que a primeira vez que se celebrou foi no ano de 1246, em Liège, na Bélgica. Mas é com o Papa Urbano IV, em 1264, fortemente influenciado pelas revelações de Santa Juliana de Cornilon, considerada uma mística da Eucaristia, que esta festa adquiriu um caráter universal, ou seja, festa para toda a Igreja.
No missal de 1570, esta festa era chamada “Festa do Corpo de Cristo”, explicitando a ênfase na hóstia. O limite que encontramos neste período é a afirmação da presença real de Jesus na Eucaristia desligada da celebração, de todo o mistério eucarístico . Pois a presença real era o foco da teologia da época de forma independente da totalidade do mistério.
Com a reforma litúrgica realizada pelo Concílio Vaticano II, esta solenidade recebeu um título mais completo: “Solenidade do Santíssimo Sacramento do Corpo e do Sangue de Cristo”, assim está no missal de Paulo VI. Não chamamos mais de festa do Corpo de Deus. Para esta solenidade temos hoje um maior número de leituras bíblicas, ou seja, um conjunto de leituras para cada ano litúrgico, que nos convidam a contemplar aspectos centrais da Eucaristia; temos dois prefácios, sendo o prefácio II (Os frutos da Santíssima Eucaristia) uma nova composição, e textos eucológicos, que falam da Eucaristia como “‘memorial da Páscoa’ (coleta) e nele estão expressos misticamente os dons da unidade e da paz (Oração sobre as oferendas); enfim, no banquete eucarístico, saboreia-se antecipadamente o convívio eterno (oração após a comunhão)”. Nestas orações, estão expressos claramente o acréscimo do sangue de Cristo, não se limitando ao seu corpo, que, antes do Concílio Vaticano II, não era colocado. Outro elemento desta celebração é a Sequência, que também nos ajuda com seu texto a meditar sobre a eucaristia. Neste dia, é um elemento facultativo como nos diz a IGMR n° 64.
Nesta celebração, acontecem a procissão do Santíssimo Sacramento, que remonta ao século XIII, e também adorações, que devem nos levar à participação da Eucaristia. Algo que é bastante interessante, e é fruto do trabalho teológico do Concílio Vaticano II é que a presença de Cristo não é mais vista desligada da celebração eucarística; na verdade, fica claro que a presença de Cristo vem da celebração da missa, e dela se prolonga . Recupera-se a relação profunda e inseparável da eucaristia e a celebração eucarística e a totalidade do mistério da páscoa de Cristo. É esta compreensão, ou seja, sentido está bem presente nos textos propostos pelo missal do Vaticano II para esta missa. Por isso é importante que a hóstia para a adoração e para a procissão deste dia seja consagrada na missa que precede; também os cânticos devem seguir as orientações do hinário da CNBB; para mergulhar neste mistério, devemos ter cuidado com cânticos que não expressam a verdade da doutrina eucarística; acerca da ornamentação, temos que ter cuidado para que ela não se sobreponha ao essencial, as flores devem estar a serviço do mistério, pois o excesso nos desvia do principal, enquanto a sobriedade e simplicidade nos ajuda a concentração no mistério celebrado.
Celebrar este dia é celebramos a Eucaristia, dom dado à Igreja, pão da vida, vinho da salvação que devemos buscar sempre. E também procurar viver o que a Eucaristia nos ensina. Aprendendo com o Cristo que se doa a nós, a sermos pão partilhado e sangue derramado na vida dos irmãos. Sendo alimentado por este pão da vida e vinho salvação, procuremos ser presença de Cristo aonde quer que estejamos vivendo o amor e doando a própria vida. Na comunhão eucarística nos unimos profundamente a Jesus; não podemos nos unir a Ele e não procurarmos viver seus ensinamentos. Não é compatível com a eucaristia, o ódio, o rancor, a autossuficiência, a injustiça, a maldade e demais coisas que vão contra os valores do Evangelho. Aproveitemos esta celebração para renovar nosso compromisso com o Cristo vivo e ressuscitado presente na Eucaristia, centro e ápice de nova vida, de onde recebemos toda a força de Cristo.