Dom Frei Manoel Delson Pedreira da Cruz, OFMCap. Arcebispo da Paraíba
A Igreja celebra a Páscoa de Nosso Senhor todos os anos. Na verdade, em cada Missa somos imersos nesse mistério de redenção, com essa celebração cotidiana, tornamo-nos semelhantes a Cristo, acolhendo, pois, o dom inestimável vindo das mãos misericordiosas do Pai do céu: o dom de ser filho no Filho. O tempo solene da Páscoa é precedido pela vivência quaresmal, e o Papa Francisco deu à Igreja uma mensagem muito rica sobre como devemos viver esse caminho de preparação. O tema da mensagem gira em torno da esperança, para fazer alusão ao jubileu da esperança. O Pontífice destaca a necessidade sincera de uma conversão comunitária, sob a guarda da sinodalidade: “Nesta Quaresma, Deus pede-nos que verifiquemos se, nas nossas vidas e famílias, nos locais onde trabalhamos, nas comunidades paroquiais ou religiosas, somos capazes de caminhar com os outros, de ouvir, de vencer a tentação de nos entrincheirarmos na nossa autorreferencialidade e de olharmos apenas para as nossas próprias necessidades. Perguntemo-nos diante do Senhor se somos capazes de trabalhar juntos ao serviço do Reino de Deus, como bispos, sacerdotes, pessoas consagradas e leigos; se, com gestos concretos, temos uma atitude acolhedora em relação àqueles que se aproximam de nós e a quantos se encontram distantes; se fazemos com que as pessoas se sintam parte da comunidade ou se as mantemos à margem.”
Quaresma é tempo também de uma conversão comunitária. Caminhar juntos não é uma tarefa fácil, mas o Evangelho nos pede essa disposição. A espiritualidade quaresmal convoca-nos para o empenho de transformar o mundo num lugar da manifestação da graça de Deus, aonde todos vivam em harmonia; e para tal, devemos estar “voltados continuamente para a Páscoa, para o horizonte da Ressurreição”, sendo um sinal de misericórdia no mundo.
Outra exigência pedida neste tempo de penitência é o desapego. Como cristãos, devemos trilhar um caminho de conversão que nos livre do estilo de vida que prioriza a ânsia do possuir cada vez mais. A ambição desmedida talvez seja um dos grandes pecados da humanidade. O homem que vive longe de Deus busca construir sua vida sobre o império da vontade própria, assume para si, de maneira decidida, a prática do pecado, impondo-se aos outros, e desinteressando-se pelo bem destes, como se fosse um senhor absoluto, um explorador da criação: “Quando se abandona a lei de Deus, a lei do amor, acaba por se afirmar a lei do mais forte sobre o mais fraco. O pecado – que habita no coração do homem (cf. Mc 7, 20-23), manifestando-se como avidez, ambição desmedida de bem-estar, desinteresse pelo bem dos outros e muitas vezes também do próprio – leva à exploração da criação (pessoas e meio ambiente), movidos por aquela ganância insaciável que considera todo o desejo um direito e que, mais cedo ou mais tarde, acabará por destruir inclusive quem está dominado por ela.” (Papa Francisco)
Ao longo da quaresma, nasce no caminho do discípulo de Jesus a chamada para a restauração de nossa fisionomia cristã, através do arrependimento e de um autêntico pedido de perdão a Deus. Somos motivados à uma renovação profunda da vida interior. À Nossa Senhora, Mãe de Misericórdia, nós consagramos a penitência quaresmal; que Ela nos ajude a bem vivermos o caminho de conversão, Ela que não precisou de misericórdia, mas nos deu a própria Misericórdia, nos afaça receber com alegria o perdão de Deus.