O caminho quaresmal da Igreja continua. Caminhamos para a Páscoa do Senhor. Nestes domingos quaresmais, a Palavra de Deus foi nos orientando, inicialmente, a uma compreensão geral para viver bem esse tempo de penitência. Com Jesus, no primeiro domingo da quaresma, fomos chamados a vencer o pecado e o diabo com a força da graça. Somos tentados, como Cristo foi no deserto, mas o caminho da fé nos garante a vitória contra o mal. No domingo seguinte, a liturgia nos propôs a subida para o monte. Com o Senhor transfigurado, haveremos de passar pela cruz, sabendo que a Ressurreição virá.
Já no domingo passado, o terceiro do tempo quaresmal, a liturgia nos fez percorrer um verdadeiro caminho batismal. Jesus pede água à Samaritana, mas, na verdade, a esta é aberta a porta da fé. O pedido de Jesus despertou no coração da Samaritana o belíssimo caminho de crer. Todo o itinerário da quaresma descortina a redescoberta do caminho batismal. Por isso, é muito importante que vivamos a liturgia da Igreja como uma adesão inegociável. Através da Palavra de Deus e dos ritos, próprios deste tempo, Deus vai renovando em nossas vidas a beleza de ser cristão. Caminhamos pelo deserto da vida, mas nunca sozinhos. Temos a Cristo como Aquele que nos precede nesse caminhar penitencial.
Ao longo do caminho da fé, vamos curando a cegueira imposta pelo pecado. Jesus se revela como a luz do mundo, a luz que nos traz de volta a visão da verdadeira fé. No Evangelho deste domingo, temos o acontecimento da cura que Jesus realiza de um cego de nascença. Naquela época, havia um consenso equivocado de que a doença era fruto do pecado pessoal e dos ancestrais. Jesus rompe com essa falsa compreensão, dizendo: “Nem ele pecou nem seus pais; mas foi assim, para se manifestarem as obras de Deus” (Jo 9,3).
Jesus viu, com compaixão, o sofrimento daquele cego e jamais poderia ter acrescentado mais sofrimento. O cego notou nas palavras e presença de Jesus a grande passagem de sua vida: da luz dos olhos para a luz da fé. O que Jesus pediu a ele foi somente uma resposta concreta de fé. Que acreditasse que Ele é o Filho do Homem. Nesse encontro de Jesus com o cego, constatamos a dureza do coração dos fariseus que se opuseram à aceitação do milagre. Recusaram porque não aceitaram Jesus como Messias.
E nós, qual o lugar que ocupamos diante das obras de Jesus? O caminho quaresmal nos leva a aderir Jesus como o centro de nossas vidas. Não é possível percorrer essa estrada penitencial sem uma real conversão ao Senhor. Não podemos continuar com o coração duro diante de tantas graças que o Senhor tem derramado no nosso caminhar. Precisamos sair de nossas cegueiras, assumir a luz que brilhou na pia batismal quando fomos batizados. A Palavra de Deus nos contagia e nos faz caminhar com a luz de Jesus, como nos lembra o Papa Francisco: “O que significa ter a luz verdadeira, caminhar na luz? Antes de tudo, significa abandonar as luzes falsas: a luz fria e fátua do preconceito contra os outros, porque o preconceito deturpa a realidade e enche-nos de aversão contra aqueles que julgamos sem misericórdia e condenamos sem apelação. Este é pão de todos os dias! Quando se fala mal dos outros, não se caminha na luz, caminha-se nas trevas. Outra luz falsa, por ser sedutora e ambígua, é a do interesse pessoal: se avaliarmos homens e aspectos com base no critério da nossa utilidade, do nosso prazer, do nosso prestígio, não exercemos a verdade nas relações e nas situações. Se formos pelo caminho da procura só do interesse pessoal, caminhamos nas trevas”.
A cegueira do pecado vai como que nos acomodando. Vamos nos acostumando com a obscuridade da cultura de morte. Basta que olhemos para a realidade ao nosso redor. O aborto, por exemplo, a cultura vigente vai introduzindo uma mentalidade insana de normatização dos assassinatos de indefesos. Fala-se da dignidade da mulher, que deve ser guardada sempre, mas em detrimento de vidas que não podem se defender – os nascituros. Isto é uma grave situação de cegueira imposta pelo pecado, e prestaremos conta de Deus. Outra situação de cegueira é a sistemática desigualdade social
na sociedade brasileira, que gera o problema da fome. O caminho de fé dos cristãos não pode fazer de conta que essas mazelas sociais não existem. A fé em Jesus Cristo nos compromete com as dores e sofrimentos de nossos irmãos.
O Senhor é a luz que se acende na escuridão do mundo. Ainda que queiram calar a voz do Evangelho, Deus não se cansará de oferecer meios que tragam aos homens a clareza da fé. Quaresma é tempo de conversão. Abramo-nos a Cristo, luz do mundo, e ofereçamos a Ele as nossas inúmeras cegueiras, com a esperança de que o nosso coração seja transformado profundamente pelo seu amor.
À Virgem Maria confiemos os dias vindouros da quaresma, para que todos os homens e mulheres possam encontrar a luz de Cristo. E que jamais nos falte alegria no caminho da fé. Afinal, depois da cruz sempre nos aguardará as alegrias da Ressurreição. E por fim, peçamos a proteção de São José, cuja memória celebramos hoje, para que a sua coragem de pai de família nos ajude a construir famílias santas em vista de um mundo novo, ainda nesta terra.